sábado, 18 de outubro de 2014

ORIGEM DO BRINDE, TIM-TIM POR TIM-TIM

Por J. A. Dias Lopes


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      Cada vez que erguemos o copo com alguma bebida, para fazer um brinde, reforçamos velho ritual de convivência humana. Nas religiões pagãs, os fiéis faziam o mesmo em louvor das divindades. Mas só encostavam o copo nos lábios e derramavam o conteúdo na mesa ou no chão. Com o passar do tempo, porém, aboliram o desperdício. Passaram a beber a maior parte, dedicando apenas alguns goles aos deuses. Na época, brindava-se com um único copo, passado de mão em mão, um cuidado que teria a ver com a prevenção do envenenamento.
      

Foto Reinaldo Mandacaru

      Os  personagens do Antigo Testamento já se encontravam na fase do brindar e beber. Leia-se o Livro de Daniel, capítulo 5. O rei Belasar, sucessor de Nabucodonosor, bebe para saudar os "deuses de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra".
Os romanos incorporaram a tradição dos gregos e não esconderam a influência: chamavam-na de "beber à moda helênica". Celebravam proezas civis ou militares, evocavam a pátria e desejavam saúde aos presentes. Quando festejavam a mulher amada, a animação se multiplicava. Esvaziavam uma taça para cada letra do nome dela. Marco ValerioMarziale, poeta latino de origem hispânica, nascido no ano 40 d.C., enunciou a regra: "Oito cálices à Giustina, à Levina se bebe seis, quatro à Lida, cinco à Licia, à Ida, três."
       Os primitivos cristãos saudavam primeiro a religião, depois os mártires. Entretanto, a exaltação foi acusada de propiciar excessos. Entre seus críticos, estava Santo Ambrósio (340-397), arcebispo de Milão, um dos quatro maiores doutores da Igreja Católica. Os bárbaros, apesar de combaterem usos e costumes dos povos que dominavam, adotaram o brinde. Tomavam vinho pelos vivos e mortos, em uma grande taça comunitária. Na Idade Média, a prática continuava desaprovada na Itália, segundo a Cronica, do frade e historiador Salimbene de Parma (1221-1288). Durante o Renascimento, permaneceu classificada de bárbara e, portanto, reprovável, como documentou o religioso e literato italiano Giovanni Della Casa (1503-1556), no tratado GalateoOverode’Costumi.
        Há duas versões para a origem da palavra brinde. Para alguns, viria da cidade italiana de Brindisi, às margens do Adriático, na região da Puglia. Ali, depois de uma ceia que culminava com ruidosos votos de boa sorte, os jovens aristocratas romanos embarcavam para a Grécia, a fim de aperfeiçoar a educação. Outros sustentam que deriva do espanhol brindis, variação do alemão bringdir’s (levo-o a você) assimilado dos lansqueneses, soldados mercenários dos séculos 15 e 16, originários do Sacro Império Romano. Os ingleses falam toast. Na época em que adotaram esse nome, praticavam o ritual com um copo que passava de mão em mão. No fundo dele havia uma toast (torrada). Cabia ao último bebedor.   
       Conta-se que, certa vez, Ana Bolena (1507-1536), segunda mulher do rei Henrique VIII, da Inglaterra, mandada decapitar pelo marido sob a acusação de adultério e incesto, tomou banho diante dos cavaleiros da corte. Um deles ficou maravilhado com o corpo da soberana. Pegou um copo, encheu-o com a água do banho e a bebeu, saudando os demais. Só um cavaleiro se recusou a participar do ritual. Interpelado, explicou porque quis ficar de fora: "Gostaria de reservar-me o toast".


Ana Bolena

      No século 19, firmou-se o costume de brindar usando copos separados, embora casais apaixonados até hoje se saúdem à moda antiga. A seguir, adotou-se o tintim, que apesar de imitar o ruído produzido pelos copos, muitos sustentam ter origem na China. Chin, naquele país, significa felicidade; chinchin, muita felicidade. Antes ou depois de bater os copos, pronuncia-se uma palavra exaltativa. Os brasileiros e portugueses desejam saúde. 
      Acontece o mesmo com os italianos (salute), franceses (santé), espanhóis (salud), gregos (steniyasas), alemães (prosit) e holandeses (proost). Os russos preferem dizer felicidade (zazdorov). Curiosamente, os suecos exclamam skäl (caveira). A palavra deriva do costume viking de beber nos crânios dos inimigos mortos, transformados em canecas. Na hora do brinde, cada povo tem sua mania...


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